terça-feira, 9 de julho de 2013

POSTANDO EM OUTRO BLOG

Não sei se aparece alguém aqui, mas... Por ora, 'tou postando em outro blog. O Takakara.

sábado, 25 de maio de 2013

quinta-feira, 16 de maio de 2013

A AVE


Estava sentado em minha poltrona, lendo e tentando esquecer a amada que não está entre hostes celestiais e sim, goza de lascívia alegria em sua nova morada.
Eu tremia de frio e tristeza, sem nenhuma poesia para enfeitar a ocasião. Foi quando aquela terrível besta – fruto de um ventre ignóbil – invadiu o meu salão.
Com um ruflar assombroso, perscrutou cada lugar. E, finalmente, encontrou um que considerou conveniente pousar.
Não sobre o busto de Atenas, mas em cima da urna de minha mãe, bem longe dos umbrais.
A negra ave de tempos ancestrais escancarou seu bico e quando pensei que iria amaldiçoar-me com um grito de “Nunca mais!”, surpreendeu-me, pois desaguava negro vômito sobre o chão. E meu receio em ouvir “Cras! Cras!” era inimigo de minha ambição.
A massa disforme e pútrida que a besta vomitara era o resumo de minha vida e a Ave profetizava: “Tu serás feliz jamais!”. Espanei o ar c’as mãos, “Vai-te daqui, besta agourenta. Deixa-me com meus ‘ais!’”.
Sofro por ela que me esqueceu, antes fosse Leonor, pois de presente só tenho a dor, já que o amor pereceu.
Olhou-me firmemente, e em seus olhos que nada negavam, pude ver os meus.
Por fim, entendi que as Trevas já me abraçavam e não adiantava gritar por Deus.
A loucura, tantas vezes invocada, tomava a razão.
Estava sozinho, não havia Ave alguma. Somente a solidão.

domingo, 28 de abril de 2013

A DANÇA

Três pancadinhas na porta.
Ela perguntou quem batia, mas não obteve resposta. Perguntou novamente. Nada.
Mais três pancadinhas.
Sem muita paciência abriu a porta. Assustou-se, pois era seu marido. Ele não era dado a esse tipo de brincadeira. Na verdade, de brincadeira nenhuma!
Estava sempre com um ar aborrecido e impaciente. Mas não hoje.
Umas das mãos escondia algo atrás, nas costas. Sorriu e estendeu-lhe um buquê.
Ela ficou parada olhando...

- Não vais pegar?
- Oi?! - perguntou atônita.
- Não vais pegar o buquê? Não te agradam essas flores?
- Sim, sim! Claro! Desculpe-me! Entre.
- Depois de você, querida.

"Querida"? Ele não a chamava assim desde... Desde muito tempo!
Entrou. Colocou as flores em um vaso.

- A noite está linda, não? - perguntou-lhe com um ar excitado.

Ela, mais uma vez, ficou sem saber o que responder. Ele sempre chegava reclamando de tudo: o trânsito [mesmo que não houvesse], calor, economia do país, o patrão ou o subordinado ou qualquer outra coisa que fosse possível! Mas, naquela noite, estava sorridente e atencioso. Então, restou a ela apenas acenar com a cabeça confirmando que a noite estava mesmo bonita.
Sem jeito, saiu da sala para deixá-lo só assistindo a TV, como gostava. Na cozinha, foi surpreendida com ele ao seu lado estendendo a mão para fazer-lhe um carinho.

- A noite está realmente linda! Não queres passear? - perguntou carinhosamente.

Definitivamente, ela não entendia o que acontecia com seu esposo, mas resolveu aproveitar toda aquela simpatia e assentiu. Correu até o quarto para trocar-se. Abriu o guarda-roupa e fitou o longo vestido vermelho que há muito não usava. Segurou-o e seu cheiro invadiu o quarto.
Ele a esperava na sala. Quando ela apareceu à porta, era outra mulher. Belíssima em seu longo vestido decotado. Os olhos dele brilharam, foi até ela e beijou-lhe a mão e ofereceu o braço que ela segurasse.

Passeavam na praça como um casal de jovens cheios de amor e graça.
Algum tempo depois, perceberam que já era tarde e não havia mais ninguém lá, mas não sentiam vontade de ir embora.
Após alguns abraços calorosos seus corpos começaram, lentamente, a mover-se de um lado para o outro. Ao som do silêncio, dançaram como nunca antes ousaram fazer.
Ela lembrou-se de quando os dois, ainda namorados, dançavam nas festas de família. Recordava do som dos bandolins tocados por seu pai e irmão.
Lembrou-se de sua juventude e de seu sonho em ser bailarina, mas por amor, abandonou o sonho para ficar ao lado do esposo. No entanto, ali, ela girava, girava, girava, apertava seu corpo contra o dele e depois rodopiava.
Aos beijos, abraços e gritos de felicidade os dois faziam juras de amor eterno um ao outro. Os vizinhos acordaram com tanto barulho e, aos poucos, acendiam as luzes de suas casas e abriam as janelas para ver o que acontecia e a praça ficou iluminada, mas ninguém foi capaz de repreender aquele casal apaixonado que transbordava amor.

Quando, ao longe, a alvorada despontava, o dia parecia amanhecer em paz.



(*) conto inspirado nas músicas "Valsinha" e "Bandolins".

terça-feira, 9 de abril de 2013

O BICHO-DEUS


Vi ontem um bicho
Na imundície do templo
Catando fé entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não questionava se era sincero:
Apertava contra si com voracidade.

O bicho não era um pobre,
Não era um deficiente,
Não era um homem.

O bicho, meu caro, era Deus.




[da série "Desconstruindo Grandes Poemas". A partir do poema "O Bicho" de Manoel Bandeira]

quinta-feira, 7 de março de 2013

SOU MULHER!


Sou Eva
Sou Maria
Sou Madalena
Sou menina
Sou dama
Sou briguenta
Sou maliciosa
Sou diva
Sou birrenta
Sou mãe
Sou irmã
Sou filha
Sou força
Sou ninfeta
Sou feminina
Sou a que apanha
Sou a que chora
Sou a que bate
Sou amor
Sou dor
Sou de verdade
Sou travesti
Sou prostituta
Sou santa
Sou dessas
Sou daquelas
Sou tantas...

quarta-feira, 6 de março de 2013

INFERNO ASTRAL

Quando dei por mim, já estava diante de uma caverna. Lembro quase nada do acidente... Apesar do intenso calor e um rosnado assustador que vinha de dentro, uma força invisível me impelia a seguir. Parei em frente a um imenso portal com um letreiro no alto: Primeiro Círculo do Inferno.

O Portal abriu-se. O calor aumentou e o rosnado também. Um pequeno diabo veio em minha direção, deu-me as boas-vindas e disse-me que ali seria o meu lugar, onde ficaria por toda a eternidade. Disse-me também que a partir de então, teria uma tarefa. Quando questionado por mim sobre o que seria essa tarefa o encarnado assobiou longa e agudamente. Ao fim do assobio, percebi que havia chamado o emissor do rosnado assustador.

Mesmo que me fosse permitido sair do Inferno, não conseguiria, pois estava paralisado. Não era somente o fato de ser um animal de uns dez metros de altura, com corpo de cachorro e possuir três cabeças. Mas sim, de que em cada cabeça, ao invés de ser a cabeça de um cachorro [em consonância com o corpo], na verdade, eram as cabeças das minhas três ex-esposas! E as três cabeças falavam ao mesmo tempo. Reclamando! Cada uma em seu momento mais insuportável.

Marcela, a primeira esposa, queixava-se de que nós não saíamos o tanto quanto ela queria. Que eu não ganhava o bastante para sustentar os seus “pequenos” luxos. E precisava de mais roupas e joias.
Adriana, a segunda, gritava que estava sentindo o cheiro de outra mulher em mim. “Perfume barato”, berrava. E queria saber quem era a sirigaita [ela ainda usa esse termo?!] com quem eu estava. Falava também que eu não pensava em outra coisa senão traí-la.
Ursula, a última, chorava e entre soluços acusava-me de não dar a devida atenção que ela merecia. Que minha indiferença a magoava. Preferia meus amigos a ela. E sabia que nunca a amei.

Ouvindo essas três cabeças no corpo de um cachorro [animal que nunca gostei!], dei-me conta que acabara de deparar-me com meu maior pesadelo. Só que a situação era bem pior, pois eu não estava dormindo para ser um pesadelo e conforme informara-me o maldito diabrete, eu ficarei aqui por todo o sempre.

O infeliz deu-me uma coleira tripla presa a uma única alça e também uma vara. Explicou que a tarefa seria colocar a coleira na fera. Desejou-me sorte e saiu.

O imenso monstro olhou-me bem fundo nos olhos e, nesse momento, percebi que as três tinham o mesmo olhar. Fiquei imaginado se todas as outras mulheres também eram parecidas. Tentei lembrar de Alice [minha atual namorada – quando eu era vivo, é claro!], mas não consegui mais do que um par de olhos brilhando porque estava diante daquela bolsa de grife modelo único. Esforcei-me um pouco mais e recorri à Leandra [primeira namorada], mas tudo que lembrei foi que seus olhos estavam sempre vermelhos – não parava de se drogar um instante –, e só falava que éramos a esperança para mudar o país.

Enquanto eu divagava, o Cérbero-Ex-Esposas se aproximou. Ergui a vara e elas [ele?] pararam de chofre. Pensei então que não seria tão difícil assim executar tal empresa. Mas ao ver a coleira, voltaram os gritos, reclamações e choros. O que, misturado, mais parecia com um rosnado demoníaco.

Antes que eu percebesse, Marcela abocanhou-me [sempre a mais ávida por destruir-me das três!]; e em seguida Ursula arrancou-me o braço esquerdo; e com sua bocarra com imensos dentes à mostra, Adriana desferiu um golpe violento contra mim. Em seguida, as três mordiam-me ao mesmo tempo e meu último pensamento foi se eu poderia morrer. Depois tudo ficou escuro. Achei que estivesse morrendo – novamente.

Acordei sendo atingido por uma vara veloz e impiedosa. Era o maldito diabrete quem dava as varadas. Reclamava que não podia estar dormindo enquanto ainda tinha uma tarefa a cumprir. Foi quando dei-me conta que estava com o corpo reconstituído. Aquilo pareceu ser normal ao diabrete, pois ele não deu a mínima e mandou-me ir atrás do cruel monstro e colocar-lhe a coleira. Fui.

Não andei muito e encontrei a besta. Esta, por sua vez, quando viu-me, tinha os três pares de olhos brilhando de satisfação e malícia. Correu em minha direção e novamente lá estava eu em sua boca. Ou melhor, em suas bocas.

Fui estraçalhado outra vez. “Morri” outra vez.

Acordei e meu corpo estava mais uma vez intacto. Foi então que entendi que isso fará parte da nossa convivência. Eu tentando adestrá-las. Elas despedaçando-me. Nada muito diferente da nossa vida conjugal e pós-divórcio...